O corte de tecidos nas confecções de roupa nem sempre é alvo dos responsáveis pela empresa quando o assunto é produtividade. Cada vez que visitamos uma fábrica e os diretores nos levam para conhecê-la vão direto para a costura. Todos os problemas da empresa, na visão de muitos, está lá. A famosa baixa produtividade das costureiras. E o corte de tecidos? Pergunto. “Sem problemas, nosso corte dá conta certinho, olha aquelas caixas ali, é tudo coisa cortada esperando para entrar na costura ou ir para facção, mas todas estão abastecidas”, é o que ouço.
Problemas no corte de tecidos nas confecções de roupa
Continuamos nosso passeio pela costura e começo a indagar sobre situações que encontro. Em uma mesa, duas pessoas, uma com jeito de encarregada, e era a própria, ensinando outra funcionária a fazer par de alças com mesma largura, ou a refilar a que está mais larga. Por que isso? Pergunto. Veio cortado errado é a resposta. A justificativa do diretor: “esse tecido é muito liso, escorrega e aí o cortador perde a referência…”. Adiante vejo uma auxiliar refilando uma fita de viés ou debrum. Foi cortado errado. No acabamento, mais gente refilando, desta vez sobras da barra em galoneira. Mesma resposta. Observo ainda outras respostas tipo: modelagem errada, faltou um lado da pala, cortaram só para um lado e por aí vai.
Como você pode perceber, o corte de tecidos nas confecções de roupa podem impactar várias áreas da produção. De volta ao relato, ao retornar, passamos novamente pela pilha de caixas que esperava para entrar na costura. Um funcionário do PPCP (Planejamento, Programação e Controle de Produção) toma nota em um bloco de rascunho. O que ocorre? Pergunto a ele. Estou fazendo um levantamento de tudo que está aqui parado, porque uma parte falta zíper, outra falta bojo, só uma pequena parte nada falta.
Se falta aviamento que impede a entrada na costura, por que cortou? Pergunto. Para adiantar o corte, é a resposta. O cortador estava sem serviço e esses eram os únicos modelos que tinham tecido em casa.
Como podem notar, há vários tipos de problema e poucos ou nenhum são da costura. Vários são do corte de tecidos nas confecções de roupa e outros ainda, nem do corte, são da modelagem e do PPCP.
Mas voltando ao corte. No exemplo descrito, a primeira impressão que temos é a de que a quantidade de pessoas no corte está superestimada, pois tem muita coisa “adiantada”. Cheguei ao ponto de encontrar, em uma empresa que produzia 50.000 peças por mês, 95.000 peças adiantadas pelo corte, ou seja, quase dois meses de produção cortada sem condições de entrar na costura. Poucos percebem, mas isto é BAIXA PRODUTIVIDADE. Quanto dinheiro está investido ali em tecido, dois meses de produção, parado. Provavelmente é dinheiro que o setor financeiro está pegando em banco, pagando juros, para financiar uma produção parada.
E no corte de tecidos nas confecções de roupa em si, tudo são maravilhas? Sabemos que não. Duas são as vertentes de treinamento: Máquina de corte e enfesto. Uma terceira situação, que algumas empresas não praticam, mas é de muita importância, é a separação. Vamos tratar, em seguida, do enfesto.
Enfesto de tecidos nas confecções de roupa
Mesmo nas empresas que possuem sistema de risco de moldes computadorizado e até máquinas de enfestar, ou ainda, CAD CAM, há como ganhar em materiais, ou seja, com redução de despercídio. O risco ideal é aquele que tenha o maior comprimento possível e a maior altura possível. Tem sido difícil conciliar isso com os volumes de venda, então, deve prevalecer o maior comprimento possível, pois ganho com tecido sempre supera as perdas em modelagem. Mas a dica aqui vai para o risco de moldes. Normalmente, o riscador deixa uma margem de 1 cm no início e mais 1 cm no final do encaixe. Quando os enfestadores preparam a mesa, deixam mais uma margem, além daquela, de 1 cm no início e no final, como garantia contra encolhimentos.
Mas se o leitor (a) que estiver na fábrica, interromper a leitura, e passar pelas mesas de enfesto, encontrará sobras que vão muito além do que está marcado na mesa e no risco. Vale à pena interromper o trabalho deles e pedir que coloquem o risco sobre o enfesto e avaliar com eles a sobra.
Nas empresas em que o enfesto é totalmente manual, o corte folha a folha é irregular e cada folha sobreposta é maior que a anterior. Não se surpreenda se encontrar na média mais de 2 cm no início e final, além da marcação. Em um enfesto de 50 folhas, são dois metros de tecido perdido. Se fizer 10 cortes de tecidos por dia, são 20m/dia ou 440m/mês.
Mesmo nos enfestos em zig-zag, se não usar guia fixo nas cabeceiras, há uma tendência em ficar maior que o necessário. Nas máquinas enfestadeiras, há uma tendência dos operadores marcarem sobras de 3 cm em cada extremidade, para garantir o corte em razão do encolhimento que PODE ocorrer. As máquinas modernas têm como prevenir e evitar esse encolhimento.
Em todos os casos citados, só se conseguirá ganhos com um bom treinamento. Recomendamos também as máquinas de corte para fim de enfesto, afinal, elas se pagam em três meses.
Ainda na preparação da mesa para o enfesto, a dupla de enfestadores deve marcar pontos de emenda de enfesto. Quando encontrar grandes defeitos no tecido, aquela parte de tecido com defeito deve ser retirada. Se formos praticar um enfesto longo, não podemos perder a parte boa já estendida na mesa. Seccionamos então o tecido e, dos locais demarcados para emenda, sobrepomos o reinício da parte boa, fazendo um transpasse, seguindo o enfesto normalmente.
Se o defeito do tecido for pequeno, não devemos retirar, pois podemos ter a sorte dele cair numa parte de retalho e não em peça. Assim, basta marcar o local com uma fita de cor contrastante com a que está sendo enfestada e continuar o trabalho. Após o corte do tecido, o cortador ou o separador verão a marca contraste na lombada do corte. Abrindo o enfesto ali, fará uma vistoria para ver se o defeito está presente em alguma parte da peça. Se estiver, basta repor aquela parte. Se o defeito não aparecer, provavelmente está no retalho.
Com a parte de material analisada e as prevenções tomadas, vamos avaliar também o desempenho da equipe do corte de tecidos nas confecções de roupa, na questão velocidade de operação, que é muito importante para o índice de produtividade.
A primeira consideração é sobre a “Dupla de Enfesto”. A harmonia entre os dois deve ser igual a de uma dupla de cantores sertanejo. Entre os cantores, uma dupla dissonante não tem futuro. O mesmo ocorre no corte de tecidos. Aqui vale uma adaptação do provérbio: “quando um não quer, dois não trabalham”. Trabalhei com uma empresa que levava isto tão a sério que, quando um enfestador pediu demissão, porque a família estava mudando de cidade, eles demitiram o parceiro. A resposta do gerente: é mais fácil treinar dois novos do que adaptar um novo ao velho ou vice versa.
Se formos às nossas salas de corte de tecidos nas confecções de roupa prestar atenção às nossas duplas de enfestadores, vamos encontrar um mais atento do que o outro; um mais rápido do que o outro; um mais dedicado do que o outro; um com mais habilidade do que o outro; um com mais “vontade” do que o outro, e várias outras comparações. Quaisquer que sejam, sempre um está perdendo o tempo que o outro perdeu. É preciso ter no corte de tecidos um gestor hábil, capaz de avaliar estas sutis diferenças e que consiga formar duplas equilibradas, harmoniosas entre si. Afinal, se tudo de fato estiver bem, quando alguém perguntar como vai o corte de tecidos nas confecções de roupa os diretores poderão, aí sim, dizer: “vai bem, obrigado!”.